Por Clayton Alexandre Zocarato
Mar Mediterrâneo – Próximo a Atenas – 146 a.C.
A galera romana navegava próxima ao Porto de Atenas.
Estava há dias no mar, e seus soldados, como seus marinheiros estavam exaustos.
A força dos seus remos não era suficiente para empurrar a embarcação rústica, e já em grau considerável de decomposição.
Nemestrino era um comandante com vasta experiência dentro da marinha romana.
Já tinha participado de muitas campanhas e combates, mas sabia que aquele sinal de desdém perante o lar de Poseidon, em ficar praticamente à deriva por vários dias, semanas, tinha algo de incomum.
A águas estavam furiosas, a tripulação faminta, e a alimentação estava escassa.
A cólera avançava de forma abrupta e impiedosa.
Olhava para o horizonte, e tinha seu pensamento em encontrar alguma embarcação grega e assim fazer daquele marasmo, algo que pudesse lhe devolver a habilidade de lutar com destreza, e combater de forma violenta os “bárbaros”, e assim honrar sua terra e assim poder voltar para os portões de Roma como herói do império.
Sonhava com o dia ao qual seria conduzido por Pretores, como sendo o articulador de uma nova Armada, ao poria fim de uma vez aos helênicos.
Todavia sabia que por aquelas águas, várias embarcações já haviam desaparecido de forma misteriosa.
Alguns diziam que aquela região era habitada por criaturas, metade humana e metade peixe, e que com seu canto infernal, pudesse atrair, marinheiros para suas profundezas e assim alimentarem de seus fluidos, e conservar suas almas no mais remoto reduto de escuridão possível.
Nemestrino, com um odor apavorante, e tendo a companhia frenética de mosquitos, assim caminha para o centro de seu barco.
Fita todos com frieza.
Sabe bem que o risco de um motim é eminente.
Ordena a seu assistente que coloque todos em atenção, para ouvirem sua fala.
- Caros irmãos romanos. Gloria e Poder eterno a nossa querida Roma. Que assim, nossa missão possa ser cumprida em todo esplendor, e que nada e ninguém nos detenha de conquistar a terra de Zeus.
Navegando lentamente, o capitão comanda sua embarcação com mãos de ferro.
Tudo era uma contemplação para se chegar a conquistar o intuito de levar todo o lucro para o Império.
Porém ao horizonte, vozes vinham como uma frota de prontidão para lutar, rompendo todos os obstáculos, para assim saciar uma sede vingança inexpugnável.
Um canto atroz.
Um pouco feroz.
Repleto de vozes...
Procurando novos algozes.
Nemestrino sai da sua sala de comando.
Caminha por entre seus remadores, e vê muitos rostos cheios de temores, mas não abaixa sua guarda.
Chama um de seus comandantes.
- Soldado. O que é essa cantoria? Tem alguma ideia do que seja isso? E quem está tirando a paz de meus homens?
- Senhor! Isso pode ser classificado como o poder das sereias. Não tenho muito esclarecimento sobre isso, mas ouvi algumas pessoas dizerem que no meio de seu mergulho, por essas águas, ocorre muito sofrimento, e aqueles que são arrastados por elas jamais regressam.
Nemestrino caminha de um lado para o outro.
Durante aquele dia todo, ficou em volta de seus pensamentos , dançando freneticamente angústias a horas afins, buscando na sua razão, algum tipo de explicação para tudo aquilo.
- Sereias? Mais uma tola maldição lançada por esses malditos gregos, para assim conseguirem parar as chances do Imperador, de conquistar suas ricas terras.
No entardecer, colocou toda sua tripulação em alerta máximo.
Na madrugada se tornou o canto, mais agudo.
Os vigilantes estavam com muito medo, e faziam suas funções de vigilância e suas sanidades ficassem ainda mais comprometidos.
As águas estavam condenadas pelas brumas da escuridão, mas lentamente suas moléculas foram sendo atravessadas por diferentes tipos de seres, balançando suas caudas, e que estavam suculentas por ouvirem gritos de desespero e pavor.
Seus gingados traziam um ódio abissal, desejando se vingarem daqueles que estavam destruindo seus conterrâneos.
Por entre cantos de uma leveza e tonicidade alucinante, estava o desejo de destruição, e de levarem todos àqueles para as profundezas de suas águas sem nenhum tipo, de piedade ou clamor.
As sereias estavam enfurecidas.
Queriam muito mais que lhes dar um refresco.
Realizariam uma carnificina marítima, que levassem esses homens, para um gozo de dor, onde suas almas ficariam para sempre empaladas sem nenhum tipo de clemência, ouvindo gritos de sufocamento, com seus pulmões sendo revestidos de águas, até chegarem as suas bocas.
Isso seria uma forma de suplício para aqueles, que só pensam em cobiça, e que em torno da ambição de seus corações, postergam a igualdade perante os homens.
As donzelas da perdição começam a subirem por entre a galera, e com sua astúcia, vão lentamente abraçando os marujos de Reno e Rômulo, e os transportando para as profundezas.
O mergulho dessa noite, seria mais do que refrescante.
Vai passar a ser mais uma morada dos infiéis, aos quais irão fazer companhia para Hades, e estarão em um labirinto de medo sem fim, como o Minotauro.
Os alaridos de suas canções de destruição avançam sem precedentes, levando incertezas de salvação, para uma perdição sem fim.
As sereias não se conformaram com pouco.
A matança dessa noite foi significativa.
Seu coro de sangue foi enaltecido com agudos sentidos de uma inteligência buscando almejar, uma paz, não sendo ela plenamente verdadeira.
A única verdade sensitiva será a destruição.
Uma humilhação esplêndida, de que mitos podem vim a se tornarem verdades em alguns momentos.
Mergulhos de ódio, em fazer o ser humano pagar por sua ingratidão espiritual.
Uma ontologia de medo, lapidada na destruição da ética.
A beleza feminina, sendo austera perante um mundo de homens, que só detinham na força física, alguma existência que viesse despertar uma consciência que viesse a dar conta de suas miserabilidades, em deixar seu egocentrismo e de que pelo poder das armas poderia se conseguir de tudo.
Depois, de terem levados todos os homens para as mais ignóbeis profundezas, Nemestrino saiu do seu diálogo, com Morfeu.
O teatro do horror, já havia composto toda a sua trama de perdição, e o comandante estava agora enfrentando sua Abjuração.
Olho para o vazio, as águas estavam calmas.
Remos, copos, pratos, todos espalhados, por entre a madeira contendo gosto de sal.
Fica perdido por entre seus pensamentos.
Suas memórias estão borbulhantes...
Com muito esforço, quebra o claustro noturno.
- Talassa apareça? Deixe de jogos? Sei que é você? Se quer, meu sangue venha me buscar logo?
Um splash, e uma sereia cor de esmeralda salta diante de si, contendo cabelos em tom ensolarado reluzente, com um tridente brilhoso, e olhos amedrontadores.
- Até que enfim, exaltou meu nome Nemestrino!
- Bem aqui estou não vou mais fugir.
- Sempre observei e sei bem o que é o orgulho de um velho desbravador das minhas águas. Você derramou muito sangue, por essas rotas, e agora terá que pagar por isso.
Nemestrino vendo que sua navegação pelo mar da vida terrena, estava se encerrando, alarde um suspiro tedioso e triste.
- Calou-me, por todo esse tempo, e agora ainda zomba de mim. Talvez eu, mereça esse refresco de morte mesmo. Não vou pestanejar, me leve consigo.
Talassa em uma voz de pouco caso responde.
- Não irás comigo, e também não te levarei para lugar algum. Só apareci para dizer, que o iludi, e que seu castigo será saber, que toda a sua dedicação para esse maldito Império de nada adiantou. Acreditou mesmo que és tão importante assim? Se quisesse, já estaria morto há tempos.