Hoje é o meu aniversário, mas minha mãe está mais triste do que de costume. Ela só consegue pensar no meu irmão gêmeo, que sumiu sem deixar vestígios há pouco mais de um ano.
Muito foi investigado, muitas teorias foram levantadas, mas ele jamais foi encontrado. A versão oficial é que ele simplesmente sumiu durante a noite, enquanto acampávamos na Floresta das Três Cachoeiras, perto aqui de casa.
Eu disse para todo mundo que acordei de manhã e ele simplesmente não estava mais lá. Como havia bebido muito durante a noite, se acredita que possa ter caído no rio, e estando bêbado, teria sido arrastado pela correnteza. Mas, não foi nada disso que aconteceu. Eu sei da verdade, e o peso desse segredo parece apertar o meu coração, cada dia mais.
Fomos pescar e acampar na mata, como já fizemos inúmeras outras vezes desde a infância. Todo mundo aqui da região sabe que há uma “zona proibida” na floresta, onde não se deve entrar. Estávamos fora dela, mas, mesmo assim algo de muito ruim aconteceu naquela noite.
Já era bem tarde quando ela apareceu do nada. Uma moça linda, de cabelos longos e negros. Estava completamente nua, e como se não bastasse aquele corpo espetacular, ainda tinha um brilho estranho no olhar, que parecia hipnotizar.
Apesar do enorme susto, comecei a ouvir uma voz ecoando na minha cabeça, me chamando até ela. Havia também um nome... AYARA!
Apesar da tremenda atração despertada por aquele corpo sensual e aquela voz sedutora, logo entendi que aquilo era algo do mal, demoníaco, e me esforcei para resistir. Mas o meu irmão, que já estava bêbado, foi uma presa fácil. Correu na direção da moça, e antes que eu pudesse fazer qualquer coisa para impedir, ela o agarrou e o arrastou para dentro da escuridão da mata, tão rápido que parecia terem saído voando.
Então eu ouvi ele gritando. Foi tão terrível que até hoje só de me lembrar eu começo a tremer e fico todo arrepiado. Tive vontade de procurar por ele na mata, pensei em voltar correndo para casa e pedir ajuda, mas o medo era tanto que não fiz nem uma coisa e nem outra. Fiquei ali, paralisado, em choque.
Não sei quanto tempo se passou. Talvez tenha sido muito, talvez tenha sido pouco. Quando dei por mim, o céu já estava começando a mudar de cor, dando a entender que iria amanhecer em breve.
Me espantei quando ouvi passos na mata, vindo em direção ao acampamento, mas susto maior levei quando Clécio surgiu às minhas costas. Quero dizer, parecia o meu irmão, mas não era mais ele. Agora era algo perverso, maligno.
Tentei me levantar para sair correndo, mas minhas pernas pareciam pesadas como chumbo. A coisa tinha presas pontiagudas e olhos avermelhados. Quando ele espichou o braço para me agarrar, entendi que iria me matar! Tenho certeza que iria!
Então ouvi passos novamente e alguém surgiu de dentro da mata. Um velho de barba branca e chapéu preto.
O velho jogou algo no rosto do vampiro, e só depois fiquei sabendo que era água benta. A coisa urrou de dor e começou a se debater e andar em círculos, ao mesmo tempo em que seu rosto e peito começavam a derreter.
Enquanto o vampiro cambaleava desorientado, o velho aproveitou para destampar outra garrafinha e despejar novamente o líquido sobre ele. Então seu corpo pegou fogo de vez, para em seguida se dissolver totalmente, em uma espécie de nuvem de poeira.
Eu conhecia o cara que me salvou. Era o Bento, um velho esquisito que vivia em uma cabana na floresta, e que todos diziam entender dessas coisas do além. Um tipo de curandeiro, mago, ou algo assim. Ele me explicou que vampiros haviam aparecido recentemente na região, não se sabe vindos de onde, e que outras pessoas já haviam sido atacadas. Eu lembrei de dois desaparecimentos recentes na região, mas, obviamente, ninguém imaginava que se tratava de algo assim.
Juramos guardar o mais profundo segredo sobre tudo que havia se passado ali, pois ninguém acreditaria mesmo, e ainda poderíamos ser acusados de assassinato. Bento recomendou que eu me cuidasse, e é o que tenho feito. Há mais de um ano que não saio de casa à noite. Nesse meio tempo, mais pessoas desapareceram misteriosamente.
Confesso que todas as noites penso naquela linda vampira. Às vezes parece que a vejo lá fora, rondando a casa de madrugada. Sinto medo, mas também desejo. Tenho receio de uma hora não conseguir resistir, principalmente quando ouço aquela voz ressoando em minha mente pronunciando seu nome de forma sensual... Ayara... AYARA!
Por André Bozzetto Junior