3 de jan. de 2021

PACTO NOTURNO

Por Adriano Siqueira

            Saí do vagão do metrô e subi as escadas rolantes, algumas pessoas olhavam para frente apressadas para sair da estação. Olhavam o relógio, outras dobravam o jornal. A roleta estava próxima e eu já a procurava. Raquel já deveria ter chegado. O que será que ela deve estar aprontando desta vez? Comecei a lembrar do último encontro. Ela estava vestida de preto e queria tirar fotos em um cemitério conhecido. Ficamos a tarde toda tirando fotos. Algumas ela até colocou em sua página pessoal na internet.

            Conheci Raquel há pouco tempo. Por e-mail e depois de muito tempo, pessoalmente.

            Mostrava-se completamente impressionada com este mundo sobre histórias de vampiros. A sua fascinação ia mais além quando me falava que era uma vampira. Que era um dos seres noturnos que vagava pelo mundo.

            Impossível, eu achava. Estes seres não existem. São histórias que adoro ler. Existe muito de erótico e sedutor neles e esta fascinação leva a muitos para este tipo de leitura.

            Mas Raquel era ansiosa. Adorava saber mais sobre eles e ler as novidades. O primeiro encontro foi completamente dedicado ao sobrenatural. Depois do cemitério, sentamos em uma praça e procuramos mais sobre estes seres. Ela sabia que alguns moravam por ali e até ficamos à noite para ver se algum saía daquela praça escondido. Por sorte, é claro, não vimos ninguém.

            Parei de pensar naquela noite por alguns instantes e voltei a procurá-la na estação, ela ainda não havia chegado. Já passavam 15 minutos de atraso. Isso me deixou mais preocupado. Ela realmente iria aprontar mais alguma. Fico impaciente e começo a andar pela estação. Até que finalmente a vejo chegar. Não era difícil reconhecê-la. Era alta e seus cabelos negros encaracolados. As roupas sempre leves acentuando o corpo que era magro e com a pele branca. Desta vez ela veio com um vestido vermelho e não estava sozinha. Tinha mais alguém com ela... Uma mulher. Eu sabia que iria ser mais uma noite diferente, afinal. Porque ela trazia uma mulher. E ela nem avisou que iria trazer mais uma pessoa.

            Fui ao seu encontro, ela me viu, nos beijamos e depois de alguns minutos parados dentro da estação, ela me disse que chegou atrasada por ter ido à casa da sua amiga e achou que ela iria adorar o passeio. Logo em seguida ela me apresentou. Seu nome era Jasmine. Um nome curioso já que hoje era raro dar nomes de flores para mulheres. Isso era coisa de livros de contos de fadas. Jasmine tinha uma beleza natural, ela usava maquiagem bem leve, o batom era da cor da pele e seus cabelos bem mais lisos do que da Raquel. Estava com uma saia preta e longa. A sua pele era branca e seus olhos castanhos. Ela era mais baixa que a Raquel. Tinha praticamente o meu tamanho e sorria educadamente. – Espero não estar incomodando. Foi ideia da Raquel. – ela dizia.

            Eu não disse nada, apenas sorri. A culpa não foi dela mesmo, e nem sabia se eu deveria ter o direito de estar culpando alguém. Talvez só a mim mesmo por confiar demais na Raquel. Mas agora tinha me vindo à mente algo que ela disse antes de sair a primeira vez comigo e que agora batia como um sino na minha cabeça.... – Sou imprevisível. – Nunca me verá fazendo algo parecido ao dia anterior. – Eu deveria ter escutado mais. Ou esperar algo assim depois do último encontro. Porém, eu gostava dela e queria conhecê-la mais. Fico imaginado o preço deste conhecimento.

            Fomos para uma casa noturna. No caminho tentei conhecer mais a Jasmine, mas a Raquel geralmente me cortava e respondia as perguntas que eu fazia para a sua amiga. Ela realmente não queria maiores detalhes sobre a sua amiga ou queria protegê-la de mim, ou o contrário. Mas uma coisa era certa. Ela não queria que eu tivesse contato com ela. Não naquele momento. Quando chegamos na fila para entrar, ela se virou e me deu um beijo. Um longo beijo. Fiquei surpreso com a intensidade dele. Parecia não me ver há décadas. Por vezes imaginei aquele momento chegando. Eu estava de olhos fechados e eu nunca fecho os olhos. Por que os fechei? Será que eu queria me sentir mais íntimo, imaginar que estou sozinho com ela e não numa fila com a amiga dela? Mas não importava. Eu a estava beijando de olhos fechados. Senti as mãos dela em meu rosto. Isso também era uma novidade agradável, Não sei se fui eu que disse para ela que adorava as mãos no rosto ou se ela fez isso sem eu dizer. Mas estava gostando. Até que a amiga dela começou a falar que a fila estava andando e meu mundo se perdeu. Naquele momento o beijo se rompeu e eu senti os seus lábios se separando dos meus bem lentamente. Quase os puxei de volta. Como eu os queria de volta. Beijar era um vício mesmo.

            Entramos na casa noturna. Estávamos com sorte. Ainda tinha cadeiras vazias e poucas pessoas no caixa para comprar bebidas. Enquanto elas procuravam um lugar para sentar, eu fui até o caixa. Comprei umas fichas para trocar por bebidas e voltei logo para elas. Foi quando eu tive a segunda surpresa. Elas estavam se beijando. Eu parei de andar rápido. Aliás, parei de andar mesmo. Fiquei olhando de longe elas se beijando sentadas. Era um beijo de paixão. De desejo. Fiquei pensando se elas realmente queriam a minha presença. Talvez eu fosse só um acompanhante. Já vi acontecer. Muitos vêm com uma pessoa e acabam indo com outra para casa. Hoje o mundo era assim. Cheio de surpresas. Até que Raquel parou de beijar a Jasmine e me chamou para a mesa.

            Eu fui... bem devagar, garanto.  Estava procurando palavras. E eu sabia que não era bem eu que deveria dizer algo, mas estava procurando palavras assim mesmo. Eu é que não queria ficar calado. Nem que fosse para mostrar bom humor. Eu estava intrigado e curioso com o que ia acontecer o resto da noite.

            Elas olharam para mim e eu fiquei segurando as fichas que tinha comprado no caixa. Raquel olhou para mim e para as fichas... Ela vai dizer algo... Eu estava prestando atenção completa a elas. Esperando alguma palavra, qualquer uma. A Raquel olhou para mim e disse: – Dois refrigerantes.

            Fiquei olhando mais alguns segundos. Ela riu e mostrou dois dedos para mim e disse novamente, bem devagar: – Dois refrigerantes gelados.

            Não acredito que ela não ia dizer nada. Olhei o bar, fui até o barman e pedi do mesmo jeito que ela fez. Mostrando os dedos: – Dois refrigerantes.

            Voltei à mesa. Desta vez a Raquel estava sozinha. Eu ia perguntar onde a Jasmine estava, mas ela me silenciou colocando de leve um dedo nos meus lábios. E logo em seguida me beijou. Aquele beijo que havia recebido minutos atrás na fila. Intenso... apaixonante, mas desta vez com uma diferença. Um leve gosto de ferrugem... Eu já havia sentindo aquele gosto antes. Quando criança... quando cortei o dedo e coloquei na boca. Lembrei do gosto. Afastei-a e eu vi a sua boca mais vermelha. Mais brilhante. Ela estava com sangue na boca. Levantei da cadeira e me afastei. Ela sorriu e tomou o refrigerante: – Venha. – ela dizia calmamente. – Não vai doer. – ela sorria como se fosse normal. Havia muitas perguntas na minha cabeça. O sangue era dela? Era da Jasmine? Porque queria que eu soubesse? No que eu estava me metendo?

            Raquel, vendo-me sem ação, pegou na minha mão. Ficou tocando meus dedos vagarosamente, levantou-se e me levou para a pista de dança. A pista ainda não estava muito cheia. Vi claramente Jasmine dançando no centro da pista. Ela não estava sozinha. Tinha um rapaz com ela. Eu não consegui ver o rosto dele. Raquel estava me abraçando e pedia a minha atenção. Deu-me outro beijo e ficamos ali, dançando e se beijando. Novamente eu fechei os olhos. Hoje estava sendo uma noite muito diferente, nunca beijei ninguém de olhos fechados. O que estava acontecendo comigo? Mas deixei as perguntas de lado. O beijo dela era muito bom. Eu estava abraçado com ela e podia jurar que alguém estava respirando bem perto do meu ouvido. Abri os olhos e interrompi o beijo por alguns segundos para ver quem estava ao meu lado. Não havia ninguém. A pista estava vazia. Tão rápido. Não era possível. Tudo bem que não havia muita gente naquela hora, mas eu podia jurar que passava de 20 pessoas. E simplesmente sumiram. Raquel não estava surpresa. Estava olhando para mim e tentando me beijar novamente. Eu recusei... Fiquei preocupado com a amiga dela. Que havia sumido junto com o pessoal. Ela não conhecia o cara que estava com ela. Falei para a Raquel que eu iria procurá-la, mas ela não entendeu muito. Eu disse para ela ficar ali enquanto eu a procurava. Ela não ficou. Raquel voltou para a mesa. Não estava de bom humor. Foi a primeira vez que a vi desta maneira. Fui à procura da Jasmine. Olhei em todos os cantos possíveis. Até que eu fui procurá-la no banheiro. Olhei para o chão e encontrei o cara que estava com ela. A cara dele enfiada na privada. Talvez estivesse passando mal. Eu toquei no ombro dele e ele caiu.... Eu vi o seu rosto e de repente meu coração acelerou muito.

            Seus olhos estavam bem abertos e o seu pescoço tinha um corte de, pelo menos, uns quinze centímetros. A camisa dele estava banhada em sangue.

           Jasmine. Eu só pensava na Jasmine. Será que ela também teve o mesmo fim? Onde ela estaria?

            Corri pela casa noturna. Procurei um segurança. Ele estava de mau humor, mas foi comigo até o banheiro. Mostrei para ele onde o cara estava. O segurança entrou e eu fiquei esperando preocupado. Afinal, ainda não sabia onde Jasmine estaria. Quando elaborava um plano para tirar as meninas de lá, fui agarrado e jogado na parede. Era o segurança. Que gritava coisas incompreensíveis. E me deixou ali no chão e voltou para frente da casa.

            Eu não entendi nada. Entrei no banheiro novamente e o corpo do rapaz não estava mais ali.

            Não havia nem sinal de sangue. – Agora chega! – eu disse, e fui procurar Jasmine e a Raquel. Eu tinha que tirá-las dali.

            Conforme me aproximei da mesa onde estávamos, percebi que havia mais alguém com elas. Mais surpresas. As coisas pareciam piorar conforme o tempo passava. O que era uma diversão estava se transformando em um pesadelo.

            Não acreditei no que vi. O rapaz que encontrei no banheiro praticamente morto. Estava ali. Vivo e sorrindo.

            Antes que eu tivesse fôlego para falar, Raquel pega na minha mão e me puxa para sentar com ela. E ao primeiro sinal de explodir de raiva, ela me beija com força. Desta vez ela cola os seus lábios aos meus e só para por alguns instantes para me perguntar se estou gostando daquela noite. Novamente, eu não tive tempo de responder. Raquel estava se divertindo. Ela sabia de algo que eu não sabia e isso me deixava fora de órbita. Estava louco por respostas. Eu tentei várias vezes dizer que tinha algo errado, mas ela só me beijava e me tocava, possuída. Aquele gosto de sangue veio a minha boca novamente. Não liguei. Desta vez eu queria seu beijo até o fim. Minha paixão por ela estava chegando no limite. Eu não queria fazer nada, apenas ficar ali aproveitando os seus toques. Com os olhos fechados eu pensava. Era só eu e ela... escutei de novo a respiração bem forte perto dos meus ouvidos. Não. Não era nada, eu queria ficar com a Raquel. Era imaginação. Não vou interromper. Mas a respiração ficava mais forte e senti a língua de alguém passar no meu ouvido e uma voz dizendo: – Relaxe... Fique calmo.

            Eu não queria abrir os olhos. Eu queria me concentrar nos toques da Raquel. Mas os toques foram sumindo. Como se ela se afastasse. Outros toques apareceram... eram mais fortes. As mãos diferentes, mais pesadas e outras mais leves. Abri os olhos e percebi que eu estava em cima da mesa. O rapaz sugava o sangue do meu braço e a Jasmine estava no meu pescoço. A Raquel estava me olhando bem a minha frente. Eu tentei gritar para ela, mas ela só fazia sinal de silêncio. Levantei a mão em sua direção. Estava perdendo os sentidos. Meu corpo estava fraco... Até que finalmente... Tudo escureceu.

 

Parte 2

 

            Escutei algumas vozes e aos poucos abri os olhos e olhei a minha volta. Eles estavam comigo. Eu estava no colo da Raquel. Ela conversava com os seus amigos até que percebeu que eu estava acordado. Ela colocou a mão nos meus cabelos e ficou alisando.  Deu um sorriso. Eu me acomodei e fiquei sentando. Ela me abraçou. Olhei para a Jasmine que segurava um copo e sorria. Eu poderia jurar que vi os dentes caninos bem salientes. Mas quando eu ia ter certeza, Raquel virou meu rosto e ficou olhando meus olhos. – Agora está tudo bem. – ela dizia baixinho. – Sempre estaremos juntos. Eternamente juntos.

            Eu perguntei por que estava tão claro e ela disse que a minha visão estava mais apurada e que não eram as luzes que acenderam, mas os meus olhos estavam vendo além de qualquer humano. E, realmente, ela tinha razão. Eu estava vendo detalhes que não via antes. As rachaduras das paredes estavam mais nítidas. Podia ver os insetos passando por baixo das mesas, escondidos nas beiradas do chão. Eu olhei para os olhos dela e os vi brilharem mais. Ela me interrompeu novamente para me dizer que ainda faltavam mais alguns detalhes. Eu não entendi direito. Até que ela chamou a Jasmine, que veio olhando para os meus olhos. Percebi que ela mordia a beirada do seu lábio inferior. Algumas gotas de sangue apareceram. Ela aproximou-se e eu recuei como podia. Fui agarrado por trás. Novamente, aquele rapaz me segurava, agora pelos braços. Eu perguntei o que acontecia. Mas a Raquel sorriu e disse:

            – Não aprecia os lábios da Jasmine? Talvez um homem seja a sua preferência.

            Ela puxa meus cabelos e levanta o meu rosto. Meus sentidos estavam embaralhados naquele momento. Eu estava tonto. Com náuseas. Eu não queria mais sangue. Tentava de toda a maneira me livrar daquela situação, mas era impossível. Minhas forças tinham me abandonado. Jasmine tocou o meu rosto com as suas mãos, ergueu a minha face e ficamos nos olhando por um momento. Seus olhos brilhavam. Raquel alisava o cabelo de Jasmine. Colocando-os para trás e mostrando o seu pescoço. Ela passava as mãos e beijava levemente. Jasmine estava com a boca aberta e a língua estava aparecendo delicadamente. Eu lambi meus lábios e a beijei. A sua língua entrou na minha boca rapidamente e senti novamente o gosto do seu sangue. Fiquei chupando sua língua por algum tempo e engoli o sangue que saia do seu lábio inferior. Raquel começou a beijar os nossos rostos. Quase senti os lábios dela se misturando com o nosso beijo. Senti a sua língua passear sobre nossos lábios. Meus olhos se fecharam novamente. Desta vez não era para imaginar que estávamos sozinhos, mas foi de pura luxúria, de êxtase, de prazer. O rapaz que me agarrava soltou meus braços e direcionei as minhas mãos para o cabelo delas. Eu não era mais o mesmo. Minha força tinha voltado. Minhas pernas estavam firmes. Senti muita ansiedade e vontade de mais e mais prazer. Jasmine parou de me beijar e tentou sair dali, mas Raquel a segurou pelo braço e disse:

            – Fique aqui até o final. Eu quero que você assista tudo desta vez.

            – Assistir o que? – eu perguntava curioso.

            – A sua morte, meu querido. Quero que ela veja tudo... Ela nunca gostou de ficar nestas horas. Ela sempre se afasta. Acha que isso a deixa pura e se remorsos. Mas hoje será diferente. Quero que ela assista todos os detalhes.

            Eu não tive tempo de retrucar, nem de perguntar o que iria acontecer. Se eu estava para morrer e se eles iriam assistir, já não me importava aquele assunto. Eu senti um formigamento por todo o corpo. A tontura possuiu meu corpo e a fadiga me vencia.

            Não tive outra escolha senão procurar rapidamente um lugar para me sentar. O ar me faltava. Estava sufocado. Debati-me como se estivesse afogado. Não tinha explicação. Eram momentos horríveis. Segurava o meu pescoço tentando respirar, arranquei a minha camisa, e tudo o que eu via era Jasmine chorando e a Raquel segurando o cabelo dela para continuar olhando para mim. A escuridão veio rapidamente e não sentia mais meu corpo.

            Em meio à escuridão e sem nenhum sinal de barulho, senti meu corpo flutuar. Estava parado como se estivesse caindo no fundo de um mar. Passei a mão na minha frente, mas não conseguia vê-las. Vi pequenas luzes. Eu forcei a vista para ver melhor, mas eram muito pequenas. As luzes aumentavam. Elas se separaram. Estavam ao meu redor. Voando tão rápido que eu não conseguia acompanhá-las. Elas estavam crescendo. Delas saíram braços e asas. Usavam amuletos. Eu tentei ler. Todos tinham amuletos que começavam com a letra “S”. Eles me empurram. Jogam-me de um lado para outro. Rasgavam o meu peito e tentavam arrancar o meu coração com toda a força. Eu gritava, mas a voz não saia. Eles tentaram de tudo para arrancar, mas não conseguiram. Eles me chutam e me batem, falam entre eles e logo eles voam para longe. Tento chorar de dor, mas as lágrimas não vêm. Meu coração, praticamente amassado por eles, me deixa indefeso e sem esperança. Tento respirar, mas não tenho sucesso. Eu pego meu coração, o tateio. Fico chacoalhando para ver se volta a bater novamente, mas novamente não obtenho sucesso.  Como última esperança, enrolo usando as veias que o prendia e coloco dentro do meu peito. Pressiono o meu peito e fico parado, esperando o meu fim. Foi aí que ouvi meu nome.

            – Roger.

            Eu já tinha praticamente esquecido o meu nome. Depois daquela noite eu nem sabia como me chamar mais.

            A voz era da Raquel. Ela deveria estar preocupada. Nunca me chamava pelo nome. Eu abri os olhos... Lentamente. Estava ainda na casa noturna. Deitado em um sofá. Ela passava a mão no meu rosto. Jasmine estava sentada bem perto da minha perna. Estava com a cabeça baixa, com as mãos no rosto. Raquel sorria. Antes que eu perguntasse o que aconteceu ela me perguntou.

            – Como foi a luta com os anjos?

            – Eram anjos? Se forem, eu não gostaria de conhecer um demônio.

            – Eles tentaram salvá-lo. Não conseguiram. Agora você faz parte de nós.

            – Esses anjos usavam amuletos com a letra “S”!

            Jasmine me olhou por um momento e depois olhou para Raquel e disse, gritando:

            – Sanni, Sansanni e Semangelaf!

            – Tem certeza? Jasmine.

            – Sim. Os anjos caçadores. Os mesmos que aprisionaram Lilith.

            Eu me levantei e fiquei mexendo o meu corpo para ver se estava tudo bem. Toquei em meu peito, mas meu coração ainda não batia. Tentei cheirar minhas mãos, mas por mais que eu enchesse os pulmões de ar eu não conseguia sentir o ar entrando. Tudo estava congelado dentro de mim.

            Eu não sentia frio e nem a minha pele se arrepiava. Passei a mão no meu braço e era como se eu estivesse coberto com algum tecido. Eu havia perdido o tato. Estava tão preocupado com o meu estado que não dei muita atenção à conversa delas. Até que elas perceberam que eu estava precisando de ajuda. Raquel me pegou pelo braço e me ajudou a sentar novamente.

            – Não se preocupe... Logo você vai se acostumar. Tome isso.

            Ela mordeu a ponta do dedo e passou na minha boca.

            Senti por alguns instantes vários sentidos voltarem de uma vez. Paladar, olfato, tato. Fiquei eufórico por alguns instantes e perguntei:

            – Apenas uma gota de sangue faz tudo isso?

            – Sim, Roger. O sangue não é apenas um alimento. É uma fonte para sentir o que os humanos sentem.

            – Incrível. Mas... E o sexo?

            – A pergunta veio mais rápida do que imaginei.

            Jasmine interrompe.

            – Vocês não têm noção do que aconteceu? Roger foi atacado pelos mesmos anjos que a Lilith. Será que não percebem?

            – O que é mais importante que o sexo? – pergunta Roger.

            – Significa que você é tão poderoso quanto ela. E que você deve ser o mestre que voltou para reinar.

            – Mestre? Eu não entendo.

            – Aqueles anjos nunca apareceram para nós. Nas lendas, eles apenas exterminavam os primeiros vampiros. Você pode ser um filho legítimo da Lilith. O nosso guia, o nosso mestre que veio para liderar e proteger os vampiros.

            – Olha. Isso me parece um absurdo. Eu nem sei muito sobre vampiros e...

Quando levantei as mãos todas às lâmpadas da casa noturna estouraram. Nos meus dedos existiam raios elétricos. Eu apontei para uma cadeira e ela explodiu como se um raio a tivesse atingido.

            Jasmine apontou para mim e disse:

            – Ele é o mestre. Eu disse. Ele veio para nos ajudar. Ele é o líder que tanto procurávamos.

            Raquel veio até mim e olhou para os meus olhos.

            – Sim, Mestre. Eu irei protegê-lo. Serei a sua guerreira. Serei a sua mão direita. Sua gladiadora, a sua mais poderosa arma e o mais desejado amor. Serei sua como e quando desejar.

            Eu a abracei e disse:

            – Eu nunca ouvi essas palavras de mulher alguma e nunca achei que um dia iria ouvir algo assim. Para mim, esse tipo de mulher nunca existiu.

            – Acredite, meu mestre. Eu serei esta mulher.

            Uma explosão nos pegou de surpresa. Fomos jogados nas paredes do local. Quando a poeira abaixa, vejo alguns homens bem na minha frente. Um deles agarra meu pescoço e me joga novamente até bater em uma parede. Eu olhava em volta e via que eu estava só. Todos haviam desmaiado. Foi quando ouvi o que parecia ser o líder dizer:

            – Então você é a reencarnação do Mestre dos vampiros? – ele ria sem parar e os outros que estavam com ele, uns três homens também riam.

            – Se sou o mestre de todos os vampiros isso eu realmente não sei, mas posso destruir facilmente todos vocês. – é claro que eu estava blefando. Sabia muito pouco dos meus novos poderes e eles tinham experiências de milhares de anos.

            Dois deles me seguram e me levam para fora. Jogam-me na rua como se eu não fosse nada.

            O líder levanta um carro e joga em minha direção. Fecho os olhos e tento me proteger com as mãos quando vejo que o carro parou em pleno ar. Levanto-me e deixo todos impressionados. Mas o líder não queria perder tempo. E pronunciou:

            – Ele aprendeu seus poderes muito rapidamente. Destruam-no!

            Os dois vampiros arrancaram um poste e os fios explodiram com a alta tensão. Passaram os fios elétricos sobre meu corpo, mas isso só me deixava mais forte. Eu os tocava e eles sentiam a eletricidade do meu corpo. Os dois queimaram em minhas mãos.

        Um dos vampiros que estava com eles voou para longe e enquanto o líder o chamava de covarde eu o agarrei pelo pescoço. Mas a energia que ele tinha era forte e me jogou novamente para longe.

            De suas mãos saiam raios. Eu corri o máximo que pude. Senti cada rajada em minhas costas. Sentia o cheio de queimado. Sabia que não iria aguentar por muito tempo, então resolvi atacar com todas as forças que eu tinha. Eu o agarrei e segurei o máximo que pude. Seu corpo me queimava, mas logo senti que ele também estava enfraquecendo e gritava:

            – Não! Eu sou mais forte! Eu tenho mais experiência.

            Mesmo assim ele fraquejava até que ele derreteu em meus braços.

            Corri para dentro da casa noturna e carreguei a Raquel e a Jasmine para fora.

            Logo que elas se recuperaram, me chamaram de Mestre e que agora o mundo tem um novo vampiro, um líder que irá levá-los para continuar o nosso legado.

            – Qual é a nossa próxima missão, meu senhor? – dizia a Raquel, sorridente.

            –Bem! Vamos nos abrigar, pois o Sol já mostra os seus primeiros raios! E... Quando chegar o momento... Uma adorável noite virá... E nossos irmãos conhecerão a nossa força, a nossa natureza e juntos...

            – Seremos imortais!

 

* Conto publicado originalmente no blog Contos de Vampiros e Terror (https://contosdevampiroseterror.blogspot.com) em 2015.


 

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